O incidente na Noruega e a ascensão dos movimentos de extrema direita
No final do mês de julho a população norueguesa vivenciou atos de extrema violência empreendidos em dois locais diferentes do país. Essa ação destaca mais um problema que a Europa vem sofrendo recentemente, a ascensão dos movimentos de extrema direita. Dentre as fragilidades que assolam o contexto europeu, tem se dificuldades econômicas, problemas relacionados à migração e ao multiculturalismo, à preocupação com a segurança do continente, e à prevenção contra ataques terroristas. Embora as suspeitas no imediato pós atentado tenham induzido a imprensa e representantes europeus de que os atos poderiam ter sido cometidos por radicais islâmicos, a origem do autor dos atos e o alinhamento do mesmo à defesa de ideais de extrema direita trazem um agravante para o conjunto de problemas á vividos pela Europa atualmente.
Na sexta-feira 22 de julho de 2011, a população norueguesa foi surpreendida com o duplo atentado no país. O primeiro desses foi destinado à sede do Governo Norueguês, em Oslo, enquanto o segundo aconteceu na Ilha de Utoya, contra jovens do Partido Trabalhista que lá se reuniam. O autor desses atos, Anders Behring Breivik, causou aproximadamente 76 óbitos e deixou pelo menos 97 feridos. Brevik é um militante pertencente a movimentos de extrema direita, movimento que defende ideais xenófobos e nacionalistas, e é avesso às questões relativas a imigração na Europa. De acordo com Breivik, as mortes causadas poderiam ser justificadas por uma imagem de uma Europa que estaria ameaçada pelo multiculturalismo político e pelo islã, ou se a, a convivência entre diferentes culturas, e principalmente entre europeus islâmicos não seria tido como algo natural e aceitável os quais poderiam deformar ou ainda subjugar a cultura européia. Brevik ainda mencionou em seus discursos que o multiculturalismo na sociedade européia não seria algo possível. Em função dessa possível ameaça à cultura, Brevik usava argumentos antiislamistas que visavam à libertação da Europa de imigrantes, até 2083 por meio de seu Manifesto “Uma Declaração Européia de Independência”, de 1500 páginas. Breivik cita em seu Manifesto Geet Wilders, líder do Parti Voor di Vri Heidi (PVV), partido que também defende uma não islamização da cultura europeia. Não obstante, como defende Wilders ao ser entrevistado 3 pela Elsevier, agência holandesa de notícias, Breivik não teria nenhum envolvimento formal com o partido e o PVV embora tenha princípios atiislamistas, busca formas de negociação que não utilizam a força e a violência.
Vê se que mesmo na Noruega, tomado como um país portador de alta qualidade de vida e de significativos níveis de distribuição de renda, surgem movimentos políticos de extrema direita que contestam o regime democrático liberal vigente.
O país que, comparativamente ao grupo dos PIIGS 6 , tem passado imune pela atual crise na zona do euro, sofre deste fenômeno que vem se potencializando na Europa nos últimos anos: a ascensão de movimentos de extrema direita, o que desvincula esta ascensão da crise econômica. A questão neste ponto é que esse tipo de movimento vem geralmente acompanhado de ideais de xenofobia e eugenia e, somado a isso, se percebe na Europa certo nível de compartilhamento e apoio a esses ideais. Pode se ilustrar esta situação a partir da afirmação de um taxista norueguês, que ao ser entrevistado pelo jornal El País deixou claro suas convicções estereotipadas ao afirmar estar inconformado por Breivik ter matado " jovens brancos e noruegueses". Ainda segundo o taxista: “Se (Breivik) odiava tanto o Islã, que matasse jovens muçulmanos ou negros”. É pertinente
acrescentar que o taxista é eleitor do Partido do Progresso, a extrema direita
norueguesa o qual Breivik foi militante. O partido, nas eleições de 2009, conquistou 614 mil votos (23% do total), o que demonstra a significância desta corrente no país. A despeito do caso Norueguês, esta ascensão também encontra solo fértil em situações nas quais as demandas populares não são correspondidas, como no caso de crise econômica e da conseqüente crise social advinda das políticas de austeridade.8 O que se percebe é a gradativa construção ideológica no continente de uma Europa essencialmente nativa, livre do estrangeiro que “suga recursos do continente”. A figura do nativo acaba por servir de depósito para as frustrações econômicas e sociais europeias. Apoiado também no discurso do continente tomado como um ambiente eminentemente católico, conforme afirmado por aqueles troncos políticos denominados por vezes “Fundamentalismo Cristão”, diversos cursos de ação são adotados, como por exemplo, o embargo da entrada da
Turquia na UE realizado preponderantemente por partidos de direita de países como Alemanha e França 9 . Assim percebe se que, ainda que se a uma parcela reduzida, este grupo extremista vem gerando conseqüências na Europa, estas por vezes nefastas como no incidente da Noruega, uma vez que seu executor justificou sua ação em ideais de
extrema direita. No caso da Alemanha é pertinente a atenção à presença do Partido Nacional Democrata Alemão (NPD) na vida política do país. O partido Neo Nazista se apóia no modelo da Terceira Via 10 e considera os indivíduos como seres desiguais que são produtos de seus ambientes. O NPD vem assim conquistando adeptos. As manifestações pacíficas que acontecem no país reúnem a cada ano uma frente mais numerosa. A passeata de aniversário do Bombardeio de Dresden na Segunda Grande Guerra, iniciada em 2005 com 12 pessoas, contou com uma comitiva de 6.000 pessoas em 2009. Outro sinal da difusão do partido pelo país foram as eleições de 2004, que, contrariando o seu passado de baixos índices, atingiu uma porcentagem de 9,2%, (acima dos 5%
necessários nas eleições federais para a nomeação de um delegado do partido para o parlamento alemão) o que possibilitou ao NPD encaminhar oito representantes ao parlamento. Não só no âmbito do Estado como também no continente, partidos com este tipo de afinidade, ainda que pequenos, são representativos na esfera política. Além disso, o que normalmente tem ocorrido são coligações entre esses partidos de extrema direita e aqueles de direita, o que potencializa o engajamento e representatividade destes partidos extremistas.
Considerações Finais
Este atentado, ainda que localizado, realça o processo de fortalecimento dos regimes de extrema direita na Europa. O conjunto dos fatores citado, tais como a tolerância a posições xenofóbicas, as manifestações fundamentalistas e crises econômicas, vem de fato contribuindo para o fortalecimento dos movimentos de extrema direita.Ademais, esse duplo atentado evidencia que enquanto as preocupações com a segurança europeia estavam voltadas às questões terroristas islâmicas, as ações da extrema direita ultranacionalista passaram, de certo modo, a ser negligenciadas. Como exemplo disso, no Relatório de 2010 elaborado pela Europol, a preocupação dominante se referia aos radicais muçulmanos que poderiam ameaçar o continente. Em contrapartida, questões relativas à extrema direita apareciam somente em uma parte do documento, demonstrando uma relevância inferior quando comparado à ameaça islâmica.
Sendo assim fica evidente a necessidade do abandono dos estigmas e estereótipos para com muçulmanos. Ainda que existam muçulmanos da linha radical, da mesma forma existem militantes radicais de extrema direita, sendo esses frutos não do islamismo, mas sim da própria Europa. Além do mais, a atual conjuntura é solo fértil para o desenvolvimento destes movimentos: com a facilidade de troca de informações os grupos fundamentalistas têm grande capacidade de se relacionar e trocar informações entre suas diferentes células, de forma que um evento como o ocorrido na Noruega pode servir de inspiração para outros do mesmo tino. E ainda que os partidos se mostrem contra este tipo de ação fanática, os que realizam estes atos geralmente se apóiam nestes partidos extremistas. Por fim, é válido afirmar que não cabe uma generalização mono causal do que gera este processo. As diversas variáveis demonstram a complexidade do assunto e a conseqüente necessidade de estudo do mesmo.